terça-feira, 12 de julho de 2011

PEQUENAS DIFERENÇAS

Desde a infância se sentia sozinho. Amigos? Era raridade. Sempre ouvia histórias de como foi complicado seu parto, às vezes sua mãe chegava a chorar ao falar sobre o assunto. Mas, fazer o que? Se Deus quis assim, o jeito era aceitar e seguir adiante. Sentava em frente ao portão de sua casa e observava os outros meninos jogarem futebol, sonhava correr com eles pela rua, machucar o pé igual a muitos, fazer os golzinhos com tijolos à vista. Pensamento complexo para uma criança, porém, a vontade de ter uma infância normal superava todas as loucuras. Queria correr pelos pastos atrás de pipas, roubar goiabas nas terras de seu José, nadar em córregos afastados da cidade, aprontar travessuras. Desejava apenas uma aventura para contar aos filhos, talvez sobrinhos ou futuros amigos. Portanto, não podia. Os exames médicos eram mais importantes do que essas brincadeiras, dizia sua mãe, dona Maria da Silva, uma senhora muito batalhadora. Iniciou a vida adulta muito cedo, muitos dizem que ela começou a trabalhar como empregada doméstica com doze anos de idade na casa de uma senhora da Zona Norte. Por isso que vivia sempre preocupada com a casa, o filho, as contas. Aprendeu a viver assim. Responsabilidade era o que tinha de melhor, pensava. Mal sabia ela que seu amor pela família superava todas suas qualidades. Antes de seu filho nascer, ela planejava estudar, fazer cursos técnicos, mas os sonhos tiveram que ser adiados após o nascimento, já que o salário do marido não era o suficiente para o mantimento da casa. Apesar das dificuldades, conseguiu mesclar, trabalho, casa e filho. Trabalhava meio período como faxineira em um consultório médico, a tarde buscava o filho na creche e limpava a casa. Nas horas vagas lia várias histórias para o menino, mergulhava nas longas histórias de Guliver, recitava Cecília Meireles, de vez em quando partia para os clássicos, Andersen era um de seus favoritos. Nunca tivera uma boa educação, porém, amava o universo mágico que os livros ofereciam. Os livros faziam parte do seu corpo, era um órgão reprodutor de imagens cinematográficas em sua mente. Foi nesse mundo que ele cresceu. Em casa, sua mãe lhe dava muita atenção e carinho, nas ruas era quase imperceptível. Na escola... Bom, percebia nos olhos das pessoas a piedade, a compaixão, a falsidade.
Certa vez, encontrou uma criança brincando com uma bola de futebol. Sentiu vontade de interagir com ela, chutar um pouco aquele objeto que a seu ver oferecia tantas alegrias aos brasileiros. Aproximou-se da criança, e se apresentou. Mas a criança apenas chorou. Vendo que a bola estava no chão, pegou-a e começou a observá-la. Como era macio, aquele couro bonito lembrava muito a bota que ganhou da Tia no último natal. Sentou-se no chão, começou a se imaginar correndo naqueles campos verdes com arquibancadas lotadas de pessoas que gritavam seu nome, os repórteres disputavam para conseguir uma entrevista sua, pessoas com canetas e papéis nas mãos imploravam por autógrafos. Porém, tudo que viu foi uma senhora de óculos tomar de sua mão a bola e sair com a criança no colo. Por que será que ninguém quer brincar comigo? Estava cansado dessa vida, os sonhos aos poucos iam embora. As pessoas das arquibancadas devagar desapareciam com o soprar do vento. De costas para sua mãe, começou a chorar. Não eram lágrimas de raiva, nem de vingança, mas sim lágrimas de solidão. Pequenas partículas de água que aos poucos umedeciam as areias do parque, partículas que regavam os pequenos pedaços de grama presentes naquele local, partículas cristalinas purificadora de ares poluídos. Até que, uma mão tocou em seu ombro. Olhou para trás e viu uma linda moça parecida com ele. Enxugou as lágrimas com a parte debaixo da camisa e levantou-se.
- Como você se chama? – Perguntou para a menina meio desengonçado.
- Me chamo Maria! – Respondeu ela.
- Ah! O mesmo nome da minha mãe. Você conhece ela?
- Sim! Ela queria me apresentar pra você.
- Ela é muito boa né? Ela sempre me trás aqui pra brincar.
- É verdade, ela é muito encantadora. Qual o seu nome?
- Me chamo João, João da Silva.
- Prazer João, sabia que nunca tinha conversado com outra pessoa igual a mim?
- Sério? O que você tem de diferente?
 - ...

“A síndrome de Down também é chamada de Trissomia do Cromossomo 21, por causa do excesso de material genético do cromossomo 21, que ao invés de apresentar dois cromossomos 21 o portador da S.D. possui três.
                                                             (Eliene Percília - Equipe Brasil Escola – 2011)


(Jucinei Rocha dos Santos – 12 de Julho de 2011)

  

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